Você já ouviu falar em “falsidade ideológica”? Sabe quais atividades podem caracterizar este crime?
A falsidade ideológica é um delito previsto em nosso ordenamento jurídico, em um capítulo que trata sobre os “Crimes Contra a Fé Pública”, onde a vítima é a coletividade através de seus entes federativos.
Assim, se você praticar o delito de falsidade ideológica, estará prejudicando principalmente o Estado por meio da falsidade documental.
Então, se você quer aprender os principais pontos sobre a falsidade ideológica, quais as penas, como comprovar a ocorrência do delito, como funcionam os julgamentos e se existe previsão de fiança para este crime, continue atento que vamos explicar.
O que é falsidade ideológica?
Falsidade ideológica é um crime com mais de um verbo nuclear (multinuclear), ou seja, para que seja configurado o delito devem ser realizadas uma das ações descritas no tipo penal, que traz três principais condutas.
As três condutas que configuram falsidade ideológica são:
- Omitir: não inserir ou não mencionar informação relevante;
- Inserir: ação de introduzir por contra própria uma declaração falsa ou diferente da original;
- Fazer inserir: proporcionar os meios para que terceiros incluam dados que não são verdadeiros.
Além da presença de uma destas ações ou omissão, para a configuração do delito deve haver uma expectativa de algum destes resultados por parte do autor do crime:
- Prejuízo de direito;
- Criação de obrigação;
- Alteração de verdade sobre fato juridicamente relevante.
Portanto, no crime de falsidade ideológica o agente deve dolosamente omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa. Bem como deve estar presente o intuito em prejudicar um direito, criar uma obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.
Como exemplo deste delito podemos citar o indivíduo que altera um contracheque para fazer jus ao benefício do auxílio emergencial, ou para reduzir a contribuição do Imposto de Renda.
O que diz a Lei?
O delito de falsidade ideológica está previsto no art. 299 do Código Penal (Decreto Lei n. 2.848/40), sob o seguinte texto:
“Art. 299 – Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular.
Parágrafo único – Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.”
Além da previsão da conduta criminal propriamente dita, o Código Penal fixa os limites máximos de pena e a multa ao qual o acusado pode ser condenado, que podem variar de acordo com o tipo de documento alterado.
Fixa ainda uma modalidade própria do crime, onde o agente é funcionário público e utiliza-se de sua função ou cargo para praticar o crime.
Quais casos considerados falsidade ideológica?
Serão considerados casos de falsidade ideológica quaisquer das ações descritas no art. 299 do Código Penal, quais sejam, omitir, inserir ou fazer inserir informações em documentos públicos ou particulares, com o fim de obter vantagens ou alterar direitos.
Ainda, além da diferenciação entre os verbos nucleares, o que gera uma diversidade de ações que caracterizam o delito de falsidade ideológica, a legislação prevê um aumento de pena em uma condição específica.
Portanto, as ações descritas no caput do art. 299 do Código Penal podem ser praticadas por qualquer indivíduo.
Enquanto que, para o preenchimento do parágrafo único deste artigo é exigida mais uma condição:
“Parágrafo único – Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.”
Assim, se o agente for funcionário público e praticar o crime prevalecendo-se da função ou cargo, a pena será aumentada em um sexto.
Vale lembrar que, quanto ao parágrafo único, é necessária a condição de funcionário público e a utilização deste cargo ou função para a prática delitiva.
Neste sentido, o art. 327 e seguintes do Código Penal determina quem será considerado funcionário público:
“Art. 327 – Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º – Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)
§ 2º – A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.”
Deste modo, para que o agente possa ser condenado pelo parágrafo único do art. 299 do CP é necessário que seja uma das pessoas descritas no artigo supracitado. Ou seja, que exerça cargo, emprego ou função pública, mesmo sem remuneração ou transitoriamente (cargos comissionados), bem como exerça alguma destas funções em entidade paraestatal ou prestadoras de serviço da Administração Pública.
Falsidade ideológica é crime?
Falsidade ideológica é crime, permanecendo nesta condição desde a entrada em vigor do Código Penal (Decreto Lei n. 2.848/40).
Qual a pena para crime de falsidade ideológica?
Não é possível determinar a pena de forma definitiva para o crime de falsidade ideológica. Isso ocorre porque diversas variáveis influenciam nas penas as quais uma pessoa pode ser condenada, especialmente neste delito.
Quando da prolação da sentença, o juiz competente irá analisar cada caso concreto, havendo diversas situações que podem aumentar ou diminuir a pena do condenado.
Algumas das circunstâncias que alteram a pena são a reincidência, antecedentes, primariedade, idade do réu à época dos fatos ou da sentença, entre outras.
Ainda assim, o art. 299 do Código Penal prevê os parâmetros mínimos e máximos para aplicação das penas quanto ao delito de falsidade ideológica.
“[…]
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular.
[…]”
No caso de o documento alvo da falsificação ideológica ser de origem pública, o mínimo de pena ao qual um indivíduo deve ser condenado será de um ano, e o máximo será de cinco anos de reclusão.
No caso de o documento alvo da falsificação ideológica ser de origem particular, o mínimo de pena ao qual um indivíduo deve ser condenado será de um ano, e o máximo será de três anos de reclusão.
Além da pena de reclusão (restrição de liberdade), o artigo prevê ainda uma pena de multa (restrição de direitos), que será proporcional à pena.
Como comprovar a falsidade ideológica?
Como dito anteriormente, para que se configure o delito de falsidade ideológica é necessário o preenchimento dos requisitos descritos no art. 299 do CP.
Para tanto, na busca de uma condenação, deve ser comprovado o preenchimento destes requisitos, como a omissão ou os atos de inserir ou fazer inserir informações relevantes, bem como do intuito em obter vantagem ou alterar direito.
Assim, para comprovar casos de crimes de falsidade ideológica os interessados devem juntar a maior quantidade de provas hábeis a identificar o documento alterado ou omitido, quais os direitos prejudicados, obrigações criadas ou alterações de verdade sobre fatos juridicamente relevantes.
A fim de provar a ocorrência dos fatos podem ser utilizados quaisquer um dos meios de produção de provas previstos em direito, como por exemplo:
- Imagens de câmeras de videomonitoramento;
- Documento alterado;
- Documento original
- Áudios;
- Mensagens em aplicativos;
- Fotografias;
- Testemunhas.
Deste modo, cabe aos interessados colher documentos a fim de indicar o preenchimento dos requisitos necessários para caracterizar o delito de concussão.
Qual a diferença entre falsidade material e falsidade de identidade?
Os delitos de falsidade material e falsa identidade podem facilmente ser relacionados ao delito de falsidade ideológica. Isso pode ocorrer por diversos motivos, principalmente por compartilharem características em comum e tratarem todos sobre falsidades.
Ocorre que, é necessário estar atento a estes tipos penais que, mesmo que compartilhem algumas semelhanças, se referem a condutas diversas, estando todas previstas no Código Penal.
Falsidade material:
“Falsificação de documento público
Art. 297 – Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro:
Pena – reclusão, de dois a seis anos, e multa.
[…]
Art. 298 – Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro:
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa.”
Este delito refere-se à criação ou alteração propriamente dita de algum documento público ou particular, onde o conteúdo do documento é alterado e é mantida sua estrutura.
Repare que quanto ao delito de falsificação de documento público não é exigida qualquer objetivo para a ação, ou seja, não é necessária a comprovação da intenção em prejudicar e alterar direito, ou de alterar verdade sobre fato juridicamente relevante.
Falsidade de identidade:
“Falsa identidade
Art. 307 – Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem:
Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.
Art. 308 – Usar, como próprio, passaporte, título de eleitor, caderneta de reservista ou qualquer documento de identidade alheia ou ceder a outrem, para que dele se utilize, documento dessa natureza, próprio ou de terceiro:
Pena – detenção, de quatro meses a dois anos, e multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.”
Já este delito refere-se à ação de passar-se por outra pessoa, sem a necessidade de que tenha ocorrido qualquer alteração em documentos. Basta portanto que o agente tenha identificado-se como alguém que não é, com o intuito de obter vantagem indevida.
Como funciona o julgamento para crime de falsidade ideológica?
A competência para julgamento dos crimes de falsidade ideológica, em regra, é da Justiça Estadual, havendo situações que alteram esta competência.
Assim, o julgamento ocorrerá após um processo judicial conduzido por Juiz Estadual competente que irá oportunizar que o acusado apresente sua defesa.
Com uma denúncia inicia-se um inquérito policial a ser conduzido pela Polícia Civil (competência estadual), onde serão verificados os indícios de autoria e a materialidade do fato.
Durante o inquérito será identificado o possível autor, bem como colhidas algumas provas e testemunhas dos fatos.
Após a finalização do Inquérito Policial (IP), o procedimento será encaminhado ao Ministério Público (MP) que é autor da ação penal nestes casos. Em outras palavras, as partes do processo serão o MP e o acusado.
Ao receber o Inquérito Policial, caso o MP entenda que as provas colhidas são suficientes para indicar suficientemente a autoria e comprovar a materialidade, poderá oferecer uma denúncia ao juiz. Caso contrário, poderá solicitar o arquivamento do inquérito.
A denúncia será remetida ao Juiz competente para julgamento que poderá receber ou rejeitar a denúncia, de acordo com sua convicção sobre a denúncia e a ocorrência dos fatos.
Sendo recebida a denúncia, será aberto prazo para que o denunciado ofereça sua resposta à acusação, que deverá ser realizada através de advogado constituído ou pela Defensoria Pública.
Neste momento as partes poderão produzir provas e acostar documentos, bem como será realizada audiência onde serão ouvidas vítimas, testemunhas e por fim, interrogado o réu.
A última manifestação das partes no processo se dará através de um memorial escrito ou razões orais apresentadas em audiência.
Finalmente, o processo será encaminhado novamente ao juiz, que desta vez, irá prolatar uma sentença. Neste momento, encerra-se a primeira instância da ação, sendo ainda cabíveis recursos.
Falsidade ideológica cabe fiança?
Fiança é uma medida cautelar através da qual é permitido ao réu que responda o processo em liberdade, até eventuais condenações ou absolvições.
Em outras palavras, nos casos em que a fiança é admitida, será fixada pela autoridade competente, e após o pagamento, o acusado terá sua liberdade segurada, e o valor prestado como fiança será mantido como garantia.
Ao final do processo, caso condenado, a fiança será destinada ao pagamento de multas e indenizações. Já no caso de absolvição, será destinada ao pagamento de despesas processuais, podendo o excedente ser restituído com correção de valores.
A fiança é permitida em quase todas os delitos, com a exceção dos crimes de: racismo, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes, crimes contra a ordem constitucional e do Estado e terrorismo.
Portanto, como a falsidade ideológica não faz parte da lista de crimes que não admitem fiança, a autoridade competente pode arbitrar fiança nos casos de falsidade ideológica, permitindo que o acusado responda o processo em liberdade.
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